quinta-feira, 24 de julho de 2008

O TRABALHO DE CADA UM

Era uma vez dois primos que foram criados juntos. Aprenderam a rastejar e a engatinhar juntos, mais tarde a correr, nadar, jogar bola e tudo o mais que os meninos fazem juntos.Eram amigos leais e devotados.Porém, com o tempo, foram se distanciando, como acontece até mesmo com bons amigos, ao saírem pela vida. Um deles dedicou-se aos livros; descobriu certo prazer em aprender e estudou muito, acabando por triunfar nos exames.O outro primo resolveu que os livros não eram lá tão boa companhia. Faltou muito às aulas, para continuar a nadar e jogar bola; ignorou os deveres e acabou fracassando nos exames.A sorte sorriu ao primeiro, que se tornou conselheiro do próprio rei. Osegundo primo acabou arranjando serviço de remador do navio real.Um dia, o rei e todos os conselheiros reais embarcaram para uma viagem rio acima. Sentados sob um dossel, na proa do barco, onde a brisa era mais agradável, discutiam negócios de estado enquanto o barco seguia.O remador, vendo o primo bem à vontade com a realeza, ficou muito abalado.- Olhe só aquele preguiçoso, espichado na sombra, enquanto eu fico aqui moendo os ossos ao sol - disse para si mesmo, continuando a remar. - Por que ele tem o direito de se sentar lá, e eu não? Afinal, nós dois não somos criaturas de Deus?Quanto mais pensava, mais furioso ficava.- Olhe só estes palermas , inúteis - começou a resmungar para umcompanheiro remador. - Intitulam-se conselheiros, mas só ficam à toa,jogando conversa fora. Por que é que nós temos que suar tanto para puxar as carcaças deles contra a corrente? Isso não é nada justo! Eles deviam estar aqui, remando também. Não somos todos criaturas de Deus?Aquela noite ancoraram para pernoitar. Todos comeram e dormiram logo. O remador acordou no meio da noite, com uma mão muito firme sacudindo-lhe os ombros. Era o próprio rei.- Há um barulho esquisito vindo daquela direção - disse, apontandopara a terra. - Não consigo dormir, imaginando o que seja. Por favor, vá e descubra.O remador pulou fora do barco e subiu correndo para o alto de um morro.Voltou poucos minutos depois.-Não é nada, Majestade - disse. - Uma gata acabou de dar à luz umaninhada de gatinhos barulhentos.-Ah, sim. - disse o rei. - que tipo de gatinhos?O remador não tinha olhado para os filhotes. Correu de novo morro acima e voltou.- Siameses - disse.- E quantos são os gatinhos? - perguntou o rei.Isso o remador também não tinha reparado. Voltou lá.- Seis gatinhos. - reportou.-Quantos machos e quantas fêmeas? - perguntou o rei.O remador correu para lá mais uma vez.- Três machos e três fêmeas - gemeu, já quase sem fôlego.-Está bem - disse o rei. - Venha comigo.Foram a pé ante pé até a proa do barco, e o rei acordou o primo do remador.-Há um barulho esquisito em cima daquele morro - disse-lhe ele. - válá e descubra o que é.O conselheiro desapareceu na escuridão e voltou pouco depois.- É uma ninhada de gatinhos recém-nascidos, Majestade - disse.- Que tipo de gatos? - perguntou o rei.-Siameses - respondeu o conselheiro.- Quantos?- Seis.- Quantos machos e quantas fêmeas?- Três machos e três fêmeas. A mãe deu à luz dentro de um barrilrevirado, logo depois de chegarmos. Os gatos pertencem ao prefeito do vilarejo. Ele espera não ter incomodado Vossa Majestade, e convida-o a escolher um deles, caso a corte precise de algum animalzinho real de estimação.O rei olhou para o remador.Eu ouvi seus resmungos, hoje cedo - disse ele. Sim, todos somoscriaturas de Deus. Mas todas as criaturas de Deus têm o seu trabalho a executar.Precisei mandá-lo quatro vezes à praia, para obter as respostas. Meuconselheiro foi uma vez só. E é por isso que ele é meu conselheiro, e você fica com os remos do barco.
"O único lugar aonde o sucesso vem antes do trabalho é no dicionário"